quarta-feira, 27 de junho de 2018

Sobre imagens e palavras...

Da proposta de compartilhar imagens sobre o tema, contamos com a participação de Sônia Lacerda que também nos presenteou com palavras. 




Por que se reescreve a história


A relação entre os povos, a cultura, a agressividade e as marcas da história são temas que têm nos interessado e a muitos estudiosos de áreas diversas. Nicolina Luiza de Petta, Historiadora especialista em História Social, Professora e Autora de livros didáticos e paradidáticos, passeou pelo tempo para nos trazer alguns desses aspectos olhados pela lente das diferenças. 



POR QUE SE REESCREVE A HISTÓRIA
                                                                  Nicolina Luiza de Petta
                                                               
A Antropologia já havia teorizado que os primeiros grupos humanos modernos surgiram na África e, posteriormente, migraram para outros continentes. Quando o genoma humano foi mapeado, ficou comprovado que os antropólogos estão corretos.
 Homens e mulheres da atualidade pertencem ao grupo denominado homo sapiens sapiens. Antes de seu aparecimentojá haviam passado pelo planeta outros hominídeos, cuja existência remonta há mais de seis milhões de anos. Todos os demais grupos de hominídeos desapareceram, o sapiens, que posteriormente foi elevado à categoria de sapiens sapiens, é o único homo remanescente. Dessa forma, temos todos a mesma origem, somos variedades do mesmo, mas o tronco é um só. 
Não há base real de sustentação para ideologias sobre grupos humanos superiores ou inferiores. Mas não é isso que se verifica ao longo da história. Ao que parece, a dificuldade em lidar com as variações do mesmo é muito grande. Em muitos casos torna-se uma impossibilidade. Por isso o variável, ou seja, o outro, tem de desaparecer, não existir ou, no mínimo, deixar de ser homo.
Era comum na Antiguidade os vencedores de uma guerra transformarem os vencidos em escravos, tirando-lhes o caráter humano ao transformá-los em ferramenta de trabalho. Era o processo de coisificação observado em muitos momentos da história, cujo resultado mais visível era fazer desaparecer o diferente, aquele que não deveria existir para não colocar em questão o modo de vida e o poder do povo vencedor. 
Chama a atenção de quem estuda o período a crueldade dos assírios, povo que ocupou a Mesopotâmia no século XX a.C., ao lidar com os adversários derrotados nas guerras. Em geral, os derrotados pelo exército assírio tinham a cabeça decepada, e seus corpos decapitados eram expostos nas ruas das cidades conquistadas. A decapitação excluía aos vencidos a identidade humana. Deixavam de ser a variação, o outro. Nos casos em que a rivalidade era maior, em que havia maior resistência no exército inimigo, os assírios esfolavam os vencidos. O ato de tirar toda a pele de uma pessoa revela o grau da necessidade de fazer o outro desaparecer. 
É possível perceber, nessa crueldade excessiva com o inimigo mais renhido, o quanto os assírios precisavam reafirmar aos demais povos, e a eles mesmos, a sua superioridade bélica. Esse é um ponto recorrente na história humana. Quanto maior é a capacidade do outro de questionar nossas certezas, nossas crenças, de criar em nós dúvidas e questionamentos, mais ferozmente ele tem de ser varrido do mapa.
Assim fizeram os conquistadores espanhóis, no século XVI, ao destruírem a então moderna cidade de Tenochtitlán, capital do império asteca, e sobre suas ruínas construírem a cidade do México. A grandeza representada por Tenochtitlán e pelo povo asteca tinha de ser apagada naquele momento em que os espanhóis tomavam as terras dos astecas e, mais ainda, do passado glorioso daquele povo, a fim de não deixar dúvidas sobre a crença de superioridade alimentada pelos conquistadores europeus em relação aos povos da América. 
A necessidade de tornar o outro inexistente – no presente e no passado – responde ao risco de descobrir o próprio erro ou descobrir que existem outras possibilidades além daquela que dá sustentação à certeza existencial. Essa questão se evidencia no longo debate que teve início no século XV sobre a existência ou não de alma nos índios americanos e nos africanos da África Subsaariana. Os europeus, depois de mil anos de doutrinação religiosa sobre o pecado, se depararam com povos que viviam felizes, com pouca roupa ou totalmente nus, que amavam, que cuidavam com afeto de suas crianças, que dançavam, cantavam e combatiam sem carregarem o sentido – e o temor – do pecado. Diante desse quadro é lícito supor que se perguntassem sobre a validade e necessidade de todo o esforço em não cometer as ações apontadas como responsáveis pela condenação eterna da alma. Em outras palavras, será que essa história de pecado é para valer?
A fim de escaparem do dilema da dúvida ou, mais grave ainda, de descobrirem que viviam um engano, muitos se apressaram a decretar que índios e africanos subsaarianos não tinham alma. Portanto, podiam viver em pecado – de acordo com a noção de pecado dos europeus – porque não tinham alma para salvar.   
Essa conclusão servia a dois propósitos: tranquilizar os corações aflitos com a existência ou não do pecado; facilitar a exploração tanto de índios quanto de africanos como mão de obra escrava. Não tendo alma não eram criaturas de Deus, portanto não seria pecado esgotar-lhes as forças no trabalho, fazer deles propriedades, separar famílias etc.
No caso dos indígenas, os poucos que resistiram à violência dos europeus colonizadores foram salvos graças à necessidade da Igreja de Roma em fazer frente à Reforma Protestante. O papado precisava conquistar novos fiéis para compensar a debandada para as denominações protestantes; a Companhia de Jesus formou a linha de frente da conversão dos povos recém conhecidos e viu na população da América espanhola e portuguesa um vasto campo de doutrinação e catequese. 
Nessa tarefa os jesuítas batiam de frente com os traficantes de escravos. Os interessados na exploração dos índios defendiam, a seu favor, a tese da ausência de alma. Para solucionar o impasse o papa Paulo III assinou, em 1537, a Encíclica Sublimis Deusafirmando “que os índios são verdadeiramente homens e que eles não só são capazes de compreender a fé católica, como, segundo nos informaram, anseiam sobremaneira recebê-la”. Não confirmou explicitamente a existência da alma, mas garantiu aos jesuítas o direito de defender os índios – inclusive com armas – dos caçadores de escravos.   
Aos africanos, por sua vez, não foi oferecida a possibilidade de trocarem a escravidão pela catequese. Pagaram de forma trágica pela casualidade de serem a variedade que colocava em questão a crença na existência do pecado bíblico e, portanto, punha em risco as bases de sustentação da mentalidade judaico-cristã.  
Era comum, na minha experiência em sala de aula, observar as crianças e os adolescentes ficarem muito comovidos quando eu trabalhava o poema A mãe do cativo, de Castro Alves, que narra o desgosto de uma mãe escrava embalando um filho que ela sabe que terá pouquíssimas chances de um futuro feliz. Os jovens se comoviam com essa infelicidade, sem se darem conta que eram – e ainda são – contemporâneos de milhões de mães que embalam filhos igualmente sem futuro. Nas ruas das grandes cidades, nas regiões onde impera a miséria, nos grotões esquecidos do mundo. 
Essa experiência leva a pensar que quando as variedades estão perdidas nas páginas dos livros não representam ameaça, mas se estão próximas no tempo ou no espaço e nos tira do conforto dos iguais a misericórdia acaba rapidamente. É possível que daqui a dois séculos os professores de História – se ainda existirem – ao mostrarem a seus alunos as cenas de violência observadas atualmente entre partidários de tendências políticas divergentes no Brasil, observem nos jovens o espanto e a dificuldade em entender porque uma população tão necessitada de união para superar a pobreza e a ignorância se divide e luta contra si mesma.     





quarta-feira, 20 de junho de 2018

O narcisismo das pequenas diferenças

Maria Cristina Carpes, Psicanalista, Mestre e doutoranda em Ciências da Linguagem do Programa de Pós Graduação em Ciências da Linguagem da Universidade do Sul de Santa Catarina sentiu-se convocada por nosso Tema Institucional e produziu um escrito para compartilhar conosco. 


O narcisismo das pequenas diferenças[1]

Maria Cristina Carpes[2]

O título deste texto remete a expressão utilizada por Freud em três de seus trabalhos[3]: no O mal-estar na civilização(1974[1930]), diz que a expressão que utiliza não ajuda muito na explicação, do que quer dizer com este termo. Mas o que será que Freud quer dizer no uso desta expressão? Sem querer fazer um exercício de adivinhação, uma vez que o discurso psicanalítico fundado por Freud não se presta a isso e tem na máxima popular “Freud explica”, um autor desconhecido que, por não se fazer conhecer, nos coloca como autores deste ideal imaginário que gostaríamos que fosse verdadeiro. Se Freud explica, quem sabe ele nos explicaria (psicanalistas e sempre aspirantes a ser) a ler seus textos e entender o que ele quer dizer, e consequentemente também poderíamos explicar aos pacientes o que lhes acomete, sem falar que também, nossos analistas nos explicariam sobre os nosso mal- estares.
Ilusões à parte, mas de que explicação estamos mesmo atrás? O que nos faz perguntar, talvez aponte para nosso ponto de angústia. Nesse ponto reaparece Freud, no belíssimo texto do O tabu da virgindade, em que diz que a angústia aparece frente a situações não habituais, diante do novo, do inesperado, do misterioso - a angústia dá seu sinal.
Nos trechos em que refere à expressão “narcisismo das pequenas diferenças” nos textos Psicologia de grupo e a análise do ego(1920) e O mal-estar na civilização(1930[1929]), o autor chama a atenção para as animosidades entre os grupos/comunidades/povos que rivalizam e vivem próximos geograficamente, como nos exemplos a cerca de nós: na rivalidade entre brasileiros e argentinos, catarinenses e gaúchos, avaianos e alvinegros, kleinianos e lacanianos e entrando mais na nossa praia, entre os lacanianos encontramos diferenças que se rivalizam. Nestes detalhamentos, vamos encontrando a sensibilidade narcísica das diferenças que nos habita.
No texto Tabu da virgindade, que vem a ser o terceiro da série das Contribuições à psicologia do amor, o autor discorre sobre os tabus presentes nas sociedades primitivas sobre a virgindade da mulher. Entende que os tabus em relação à virgindade feminina, bem como, os rituais que envolvem o defloramento nestas sociedades, expressam o temor que o homem tem frente ao ato sexual com a mulher, enquanto portadora de “pequenas” diferenças que fazem uma grande diferença frente ao temor narcísico da castração enquanto falta da completude. Tais temores por estarem recalcados, seguem ativos também nas sociedades contemporâneas. São as palavras de Freud (1970 [1918], p. 184) sobre o medo que envolve o tabu:
Talvez este receio se baseie no fato de que a mulher é diferente do homem, eternamente incompreensível e misteriosa, estranha, e, portanto, aparentemente hostil. O homem teme ser enfraquecido pela mulher, contaminado pela sua feminilidade e, então, mostrar-se ele próprio incapaz. O efeito que tem o coito de descarregar tensões e causar flacidez pode ser o protótipo do que o homem teme; e a representação da influencia que a mulher adquire sobre ele através do ato sexual, a consideração que ela em decorrência do mesmo lhe exige pode justificar a ampliação desse medo.

O tabu expressa medidas organizadoras e protetivas para tentar dar conta de um perigo. O perigo que o tabu da virgindade quer evitar é a diferença sexual. Mesmo que, apareça transvestidas de outras diferenças, como nas intolerâncias sociais, raciais e religiosas que proliferam no nosso dia a dia e nos acompanham por diversas épocas. Freud chama nossa atenção, que na base das intolerâncias das pequenas diferenças entre nossos vizinhos de porta e de corpo (dentro das famílias), o que está na base, como ponto de angústia é o horror da diferença sexual.
Por que a diferença sexual tem tamanha propriedade em nos afetar? Quem sabe, porque está no corpo. Homens e mulheres são diferentes anatomicamente, por mais que a cosmetologia e os avanços tecnológicos disfarcem.
Em psicanálise sabe-se que dizer do corpo não é pouca coisa. É aí no corpo erógeno que pulsam as pulsões. Temos novamente a diferença sexual transcendendo a anatomia, melhor dizendo, pervertendo a anatomia e marcando novamente que as diferenças que importam estão na forma de obtenção do prazer no corpo. 
Lembramos, mesmo que depois caia no esquecimento, que a castração é um evento de significação simbólica, numa magnitude de ideais narcísicos. Sendo um bom leitor de Freud, Lacan retoma e toma muito a sério a dimensão da castração na constituição do sujeito do desejo na linguagem.
A diferença feminina protagoniza o temor à castração, como um operador que nos constitui como sujeitos psíquicos pela falta que a diferença revela. Somos diferentes, sendo diferente algo falta em mim que o outro tem, ou se na diferença a falta aparece no outro, também pode acontecer comigo. É nestas pequenas diferenças, já que somos todos mortais e faltantes, que ficam evidenciadas nas proximidades, nos laços sociais, nas rivalidades, nos amores, nos ódios e que aparecem para que não se saiba que a diferença nos torna semelhantes na falta. A sociedade ocidental privilegia a presentificação da imagem, onde o falo, como um totem, traz à ilusão que a imagem é a verdade.
Eu– como instância narcísica, portadora de um narcisismo secundário e meu vizinho – o outro,  somos castrados, mas cada um na sua maluquice singular de tentar encobrir e esquecer disso. Para tal, brigamos, rivalizamos, digladiamos com a ilusão que assim, não veremos que as diferenças que portamos, por pequenas que sejam nos fazem desejar o outro, para montar uma fantasia possível de satisfação. 

REFERÊNCIAS

FREUD, S. O tabu da virgindade (Contribuições à psicologia do amor III) (1918). In: Edição Standard Brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud. v. XI. Rio de Janeiro: Imago, 1970.
______. Psicologia de grupo e a análise do ego. (1921). In: Edição Standard Brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud. v. XVIII. Rio de Janeiro: Imago, 1976. 
______. O mal-estar na civilização (1930). In: Edição Standard Brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud. v. XXI. Rio de Janeiro: Imago, 1974.





[1]Texto elaborado para os estudos e atividades preparatórias para as Jornadas da Maiêutica 2018.
[2]Psicanalista. Mestre e doutoranda em Ciências da Linguagem do Programa de Pós-graduação em Ciências da Linguagem da Universidade do Sul de Santa Catarina.
[3]Os trabalhos referidos são: O tabu da Virgindade (Contribuições à psicologia do amor III), (1918 [1917]); Psicologia de grupo e a análise do ego (1920) e o O mal-estar na civilização (1930[1929]).

O QUE É A PEQUENA DIFERENÇA?

 Alana Nunes Remor retomou na obra de Freud os momentos em que o fenômeno narcisismo das pequenas diferenças foi apresentado e nos trouxe sua reflexão sobre o que é a pequena diferença. 


O QUE É A PEQUENA DIFERENÇA?
Alana Nunes Remor[1]

            A fim de discutir o tema, o narcisismo das pequenas diferenças, proponho um resgate dos textos freudianos onde essa expressão aparece.
            O primeiro registro é em 1918, no texto O tabu da virgindade. Nele, Freud comenta que Crawley afirma que “cada indivíduo é separado dos demais por um tabu de isolamento pessoal e que constitui precisamente as pequenas diferenças em pessoas que, quanto ao resto, são semelhantes, que formam a base dos sentimentos de estranheza e hostilidade entre eles. Seria tentador desenvolver essa ideia e derivar desse narcisismo das pequenas diferenças a hostilidade que em cada relação humana observamos lutar vitoriosamente contra os sentimentos de companheirismo e sobrepujar o mandamento de que todos os homens devem amar ao seu próximo.” (Freud, 1918, pp.206-207).
            A expressão aparece novamente em 1921, em Psicologia das massas e análise do Euonde comenta que essa hostilidade está presente nos relacionamentos duradouros, embora seja mais difícil percebê-la, em função da repressão. Já nas relações em unidades maiores ou entre subordinados e superiores, por exemplo, essa hostilidade se mostra com mais clareza. (Freud, 1921, p.112) Isso pode ser exemplificado pela relação de certa antipatia jocosa entre os brasileiros e os argentinos ou mesmo entre catarinenses e gaúchos ou paranaenses. Ou seja, as competições que ocorrem entre vizinhos.
            Em 1930, no texto O mal-estar na Cultura, Freud retoma essa característica das comunidades com territórios adjacentes, ou seja, a competição constante entre vizinhos e diz: Dei a esse fenômeno o nome de ‘narcisismo das pequenas diferenças’, denominação que não ajuda muito a explicá-lo. (Freud, 1930, p. 119)
            Por fim, em 1939, Freud escreve em Moisés e o monoteísmo, aprofundando um pouco sobre o que seriam as pequenas diferenças, que essas não são definíveis, ou seja, a diferença não é visível e que é nesse caso em que a intolerância é muito mais intensa. Então, a hostilidade é muito mais forte contra as pequenas diferenças do que contra as diferenças fundamentais. (Freud, 1939, pp.104-105)
            Como podemos entender a expressão ‘pequenas diferenças’ que qualifica o narcisismo, tema do nosso estudo? 
            No texto Psicologia das massas e análise do Eu, Freud dá uma direção quando fala sobre as identificações. O mestre vienense a cita como “a mais remota expressão de um laço emocional com outra pessoa” (Freud, 1921, p.115) A identificação tem um papel na história primitiva do Édipo, por exemplo, o menino gostaria de ser como seu pai e tomar seu lugar em tudo; toma o pai como seu ideal. 
            O Eu, desde Freud, é consequência das identificações; e do mesmo modo, afirma que é a sede do narcisismo mais do que da consciência. Vappereau adverte que o narcisismo não é um defeito. No estádio do espelho, ocorrem duas posições do sujeito em seu corpo: o corpo no espelho como corpo do outro, ou seja, extrínseco e, por outro lado, eu sou intrínseco a meu corpo. Coordenar essas duas posições parece um ato simbólico impossível. Assim, o narcisismo é uma tensão erótica violenta necessária para praticar o simbólico (Vappereau, 2016). Para Lacan, o Eu se forma pela identificação narcísica com a imagem do semelhante – a imagem especular que lhe oferece uma ideia de inteireza e independência. Por outro lado, essa semelhança pode se tornar ameaçadora já que, o outro semelhante pode, por isso, querer tomar seu lugar. Por isso, o vizinho é quem pode colocar em perigo a autonomia e integridade do Eu. Daí que, o Eu coloca nessas semelhanças a hostilidade caracterizando-as como diferenças. 
            Em suas origens, a identificação entre o menino e a menina, parte de uma imagem totalizada que em algum momento, é gravemente quebrada por uma pequena, sutil e única diferença: os genitais. Segundo Lacan, no Seminário ...ou pior,  só se reconhecem como falantes ao rejeitarem essa distinção através de toda sorte de identificações. Há uma lógica em questão: eles não se distinguem, os adultos os distinguem, descrevendo e tratando-os pelas características de homenzinho e de mocinha, ou seja, o que ainda não são. (Lacan, 1971, p.16)
            Dessa forma, a identificação simbólica é caracterizada pela consideração de apenas um traço, é uma referência a um traço específico e único. Um exemplo emblemático é o bigode do Hitler. Na infância, o que quebra as identificações, até então baseadas nas semelhanças, é uma única pequena diferença que vai ter consequências na vida do sujeito através das formações de teorias sexuais, das identificações, das preferências, enfim, da pergunta pelo ser do sujeito.
            
Referências:
FREUD, S. “O tabu da virgindade”. In Obras Completas. Rio de Janeiro, Imago, Vol. XI, pp. 206-207.
_______ . “Psicologia das massas e análise do eu”. Op. Cit. Vol. XVIII, Cap.VI. p. 112 e Cap. VII p. 115.
_______ . “O mal-estar na cultura”. Op. Cit.Vol. XXI, Cap. V. p.119.
_______ . “Moisés e o monoteísmo”. Op. Cit.Vol. XXIII, pp.104-105.
HARARI, R.“¿Por qué las pequeñas diferencias son tan grandes?” In Psicoanálisis in-mundo. Buenos Aires, Ediciones Kargieman, p. 165.
LACAN, J. “A pequena diferença” In Seminário 19 ... ou pior. Rio de Janeiro, Zahar, p.16.
VAPPEREAU, J.M. “La única construcción simbólica efectiva es el chiste” In El Telegrafo. Disponível em: https://www.eltelegrafo.com.ec/noticias/186/34/jean-michel-vappereau-la-unica-construccion-simbolica-efectiva-es-el-chiste
            




[1]Psicanalista, Membro da Maiêutica Florianópolis – Instituição Psicanalítica, graduada em Psicologia pela Universidade Federal de Santa Catarina e mestranda em Psicanálise na Universidad Kennedy em Buenos Aires.

quarta-feira, 13 de junho de 2018

CAMALEÕES EM BRANCO E PRETO E BORBOLETAS SEM ASAS...

Diante da proposta de trazer imagens que ilustrem o narcisismo das pequenas diferenças, Cléia Canatto trouxe também seu relato, propôs questões e criações.



Florianópolis, 2018 - retratos da autora de Grafiti na sede da Previdência Social no centro da cidade






Moro no centro da cidade e se não fosse esse o meu trajeto para levar diariamente minha filha à Escola, possivelmente essa imagem não teria me chamado tanto a atenção -  mesmo enquanto apreciadora das mais diversas expressões artísticas - quando muito a identificaria como mais uma criação interessante, em meio a tantas que o artista plástico Rodrigo Rizo espalha pela cidade, sendo os camaleões considerados a sua marca registrada.

Mas, ali foi diferente... 
Desde meados de 2016, acompanhei as transformações ocorridas naquele espaço, daí numa certa manhã aquele Grafiti  ter me impactado tanto... O que inicialmente era mais uma fachada de um órgão público, transformou-se progressivamente numa fachada de um espaço privado daqueles que são conhecidos por alguns como "mendigos", "pedintes", por outros como "drogados", por outros ainda como "moradores de rua". Isso foi se dando pouco a pouco, sendo que no início um ou outro se acomodava ao redor da sede. No verão, eles e seus corpos; com a chegada do inverno, eles, seus corpos, um ou outro cachorro dormindo ao lado, algumas cobertas e alguns pertences como mochilas, sacolas, garrafas. 

Progressivamente, tanto o número de pessoas quanto a diversidade dos pertences foram se multiplicando; não havendo mais um ou outro acomodado em pontos do espaço, tampouco com aqueles mesmos pertences. Até então, presenças e pertences discretos amparados pela naturalização que se faz dessa realidade, passavam até mesmo desapercebidos por aqueles que ali transitavam. Naturalização percebida a partir de como os transeuntes se deslocavam por aquele espaço. Muitos deles caminhavam apressadamente e desviavam daquilo que já era sabido ali  estar e de como desviar. Outros, expressando certo receio de chegar muito perto e possivelmente serem abordados para darem alguma esmola - aqueles que possivelmente os vêem como mendigos; outros ainda, parecendo temer serem agredidos - aqueles que talvez os vêem como drogados; e aqueles também que pareciam se surpreender; outros, se comover; outros ainda, se indignar...

Aquela escultura de humanos que ali se multiplicava, cresceu não somente em número, pouco a pouco aquele espaço parecia deixar de representar somente a possibilidade de terem um teto para dormir ao anoitecer e acordar antes que a Previdência Social abrisse suas portas. 
Elegeram-no como sua casa, passando a ali permanecerem por todo o dia com seus pertences, transformando aquele espaço de concreto aberto, num projeto de casa; onde as barracas e os guarda chuvas foram sendo utilizados para a delimitação de espaços outros; duas bicicletas foram estacionadas alinhadas aos cantos-garagens; os cachorros acordaram e despertos  circulavam atentos aos seus donos; as roupas saíram dos corpos e das mochilas e em algum momento ocuparam os varais; uma vassoura dava sinais das tentativas de manter aquela casa limpa. Ali permaneceram por algum tempo. 

Numa dada manhã, observei que tanto o número de pessoas que ali morava, quanto os pertences que lhes acompanhavam, voltaram àquela configuração inicial, de menos pessoas com menos pertences. O projeto de casa parecia ter sido abandonado. Ainda assim, um ou outro ali permanecia. Passado mais um tempo, numa outra manhã fui surpreendida com um tapume pintado de branco cercando todo aquele espaço, contendo ali a seguinte informação: "Obra de Revitalização - INSS". Pensei: “hum... uma Revitalização...”

                                               "Revitalização: "substantivo feminino / ação, processo ou efeito de revitalizar, 
                                               de dar nova vida a alguém ou a algo.Ex. sua revitalização deveu-se a um
                                              novo amor / série de ações mais ou menos planejadas, geralmente
                                              provenientes de um grupo, comunidade etc., que buscam dar novo vigor, nova
                                               vida a alguma coisa. Ex. é preciso promover uma revitalização da cultura
                                               nesta cidade".(Definição extraída de dicionário on-line).

Mais uma vez pensei: “que (...) ação, processo ou efeito de revitalizar, de dar nova vida a alguém ou a algo (...); seria implementada naquele espaço?”  
A revitalização em questão se ocuparia de dar nova vida a alguém, àquelas pessoas que ali moravam? Ou a algo, àquele espaço físico? A ambos? A nenhum?

A cada manhã que ali passava, o tapume branco me provocava a pensar: “o que acontecerá com esse espaço, que nunca mais passará em branco por mim?” Uma resposta ali apareceu. Rodrigo Rizo grafitou naquele tapume de ponta à ponta, dois camaleões, em cores distintas, acompanhados da seguinte frase exclamativa : "Só através do amor é possível alcançar a paz"!

Muitos meses se passaram desde então e lá permaneceu a obra. Tempos depois, do outro lado do prédio, no outro tapume, um artista anônimo grafitou: "Borboletas"...
Os significantes camaleões e borboletas me sugeriram um terceiro: transformação...
Ainda que bem saibamos que a noção de transformação se aplica aos outros bichos, que não ao 'bicho-homem' e que em se tratando desse segundo, quando muito podemos pensar em algumas possibilidades de mudança, me interrogava: “afinal, de onde viriam os tais amor paz que possibilitariam àquelas pessoas que lá pousaram sem asas, alguma mudança que lhes atendesse às necessidades mínimas que ali ensaiaram vir a ter?”

Momento em que me perguntava: “que possibilidades poderiam ser pensadas, no que diz respeito à viabilização de uma escuta analítica em situações sociais críticas?” Advertida de que isso, evidentemente, representaria o desafio de construir metodologia e intervenção próprias que sustentassem um trabalho distinto do que sabemos se dar no clássico Setting analítico.

Desde então, essa experiência me instigou a estar mais atenta àquilo que já havia escutado em alguns contextos acerca da psicanálise em extensão. Entretanto, nesse momento, a partir de algo de uma outra ordem, provocativa, me interrogando naquelas manhãs sobre: “de onde viriam os tais amor paz que possibilitassem àquelas pessoas que lá pousaram sem asas, alguma mudança que lhes atendesse às necessidades mínimas que ali ensaiaram vir a ter? O que, um psicanalista escreveria naquele muro?”

Ainda que as noções de amor e paz para a psicanálise possam se apresentar  radicalmente distintas do que aquela que a frase grafitada sugere; talvez pudéssemos pensar ali numa escuta analítica, onde o desejo do analista operasse como motor para sustentação de algum trabalho, que muito longe de possibilitar atingir a paz, provocasse alguma mudança mínima que fosse, para que as borboletas dali espantadas pudessem alçar vôos singelos que fossem, exatamente à altura de suas possibilidades e limitações, na exata e não diferente altura de todo analisante que chega até os nossos consultórios.

Questionamento, aparentemente ingênuo, equivocado, desavisado... se considerarmos que isso, definitivamente, não diz respeito à psicanálise e que pensar o contrário significaria negar as suas limitações, ou seja um dos seus conceitos centrais, a castração. 
Bem, se assim fosse, enquanto psicanalistas nos caberia nos ampararmos na máxima acerca da psicanálise em intenção e comungar com o entendimento que me parece cada vez mais questionável que colocaria a intenção de um lado e a extensão de outro, colocando em cena a clássica discussão acerca da psicanálise aplicada.

Tema que me reporta a uma fala por ocasião da XV Jornada Brasileira de Convergência - CER-BRASIL, em meados de 2017, em Porto Alegre, onde o psicanalista Luciano Elia ao discorrer sobre o porquê havia escolhido o título para o seu texto ali a ser apresentado: "O desejo do psicanalista presentifica a intensão na extensão e se estende à política"; lançava a seguinte interrogação:

                                             "(...) Por que colocamos o desejo do psicanalista no ponto
                                              mesmo de junção, de articulação da intensão com a extensão? 
                                              Poderíamos supor que o desejo do psicanalista, por ser o ponto
                                              mais nobre, mas avançado, do que se pode chegar em uma análise, diria
                                              respeito eminentemente ao campo da intensão, da experiência analítica que se
                                             desenvolve entre psicanalisante e psicanalista. Isso é verdade, mas justamente
                                              o que estamos propondo é que é esse desejo, e não qualquer outro, que é
                                              exigível para que o psicanalista atue no campo da psicanálise em extensão e
                                              incida no laço social para além dos limites estritos do laço analítico com o
                                              sujeito em análise, presentificando a psicanálise no mundo, função definida por
                                              Lacan como sendo a de sua Escola.(...)"
         

Mais adiante, no que diz respeito à psicanálise em intenção e extensão, o autor segue:

                                     (...)um primeiro cuidado a tomar, pelo bem do rigor, é portanto o de
                                             não confundir a categoria psicanálise em extensão (que só ganha sentido em
                                             relação com sua contrapartida psicanálise em intensão) com psicanálise
                                            aplicada, por exemplo, ao campo público, da saúde mental ou campos afins, da
                                             intervenção em espaços urbanos públicos como a rua, por exemplo (o que se
                                            apresenta hoje como uma possibilidade e até certo ponto uma exigênciaética
                                            para os psicanalistas). O plano da extensão constitui a função da Escola de
                                             Psicanálise ao presentificar a psicanálise no mundo e assegurar os meios de
                                            sua transmissão, seja pela formação de seus operadores (novos psicanalistas), 
                                            seja pela dedução de o que é um psicanalista (através do passe), mas
                                            justamente não pelo ensino da psicanálise, que não é função da Escola, mas
                                            dos psicanalistas por sua conta e risco (...)".

Oportuno registrar, que as questões levantadas pelo Autor, em vários momentos daquele contexto de Convergência integravam também outros discursos, não representando um discurso isolado, ao contrário, corroborando inclusive relatos de experiências que já haviam passado por aquela Mesa de Trabalhos. Experiência em que, efetivamente, se vivenciou  um espaço de abertura para que as diferenças fossem faladas, escutadas e refletidas... Assim como, se produzisse trabalho a partir da Divergência, com possibilidades de conferir ainda mais legitimidade a um movimento de Convergência.

No momento em que na Maiêutica lançamos como tema institucional  "O Narcisismo das Pequenas Diferenças", sinto-me instigada ainda mais a escutar e debater  as diferenças no que diz respeito também a outras práxis da psicanálise que transcendam as paredes dos nossos Consultórios e ousem pensar e propor uma escuta analítica nos mais distintos contextos, podendo chegar até mesmo às ruas da cidade... 

Por fim, retomo agora o Convite lançado no blog para enviarmos imagens que nos viessem à mente sobre "O Narcisismo das Pequenas Diferenças"; endereçando alguns questionamentos especialmente aos colegas psicanalistas, a partir da referência de um caminho que já trilhei quando enviei uma sequência de três imagens acompanhadas de ditos de Freud acerca do Narcisismo, para serem divulgadas nesse blog.

A primeira, estava representada pela imagem clássica de Narciso descrita poeticamente por um fragmento de uma música de Caetano Veloso, (...)" Narciso acha feio o q não é espelho"(...) a segunda,fazia referência à rivalidade, inveja e desprezo ao vizinho de aldeia, referenciados por Freud. A terceira abordava, literalmente, o fenômeno das rixas e ridicularizações, o que Freud chamou de “ Narcisismo das Pequenas Diferenças”.
A psicanalista Betty Fuks, autora do livro "Freud e a Cultura", conferencista convidada para abertura das Jornadas,  reporta-se a esse fenômeno esclarecendo:

                                     "Em termos "normais", o "narcisismo das pequenas diferenças" está na base
                                             da constituição do "nós" e do "outro", na fronteira que tem por função
                                             resguardar o narcisismo da unidade. Trata-se de um fenômeno que ocorre na
                                              tensão que existe entre povos vizinhos (...) entre indivíduos de estados de um
                                             mesmo país, (...) ou até mesmo dentro de uma mesma cidade(...). Ou seja, são
                                             pequenas diferenças reais que impedem que o outro seja um perfeito
                                             semelhante, o que significa que o ódio não nasce da distância, mas da
                                              proximidade. E, exatamente por que não se trata de uma diferença qualquer, é
                                             que se produz o estranhamento que detona impulsos hostis contra aqueles que
                                              estão apenas um pouco mais além do espelho".

Retomando as questões anteriores, no que diz respeito à primeira imagem, perguntaria: que na práxis analítica poderíamos achar feio, sendo considerado um outro espelho? Sobre a segunda, ainda que não habitemos duas aldeias, muitas vezes até mesmo uma mesma Instituição e como tal não olhemos com rivalidade e inveja da outra; em que momentos e por que a rivalidade e a inveja se instalariam na nossa aldeia-Instituição? Quanto à terceira, em que momento as rixas e as ridicularizações que Freud chamou de “ Narcisismo das Pequenas Diferenças", se instalariam e passariam a ganhar alguma visibilidade? Com que intenções, funções, propósitos? Em resumo: como temos lidado com as diferenças nas Instituições psicanalíticas? 

O que não é o espelho precisa, necessariamente, ser achado feio?
A rivalidade, inveja e desprezo seriam as estratégias a serem adotadas para a inibição, o combate e a destituição das diferenças? As rixas e as ridicularizações não poderiam abrir espaços para divergências mais produtivas?

Nesse momento me vem à memória duas falas que escutei a partir da definição do tema dessas Jornadas que me chamaram especialmente a atenção:  a primeira, associada diretamente a uma reação muito espontânea por parte de um colega, que quando perguntando sobre qual teria sido o tema institucional definido para 2018 e consequentemente para as Jornadas, ao escutar ser  "O Narcisismo das Pequenas Diferenças", arregalava os olhos e dizia "Corajosos nós (...)". A segunda, de uma colega que quando da realização da primeira atividade para estudo do tema institucional, quando discutíamos o eixo teórico a ser definido,  dizia temer que nos concentrássemos nos textos clássicos de Freud acerca do tema e não nos ocupássemos, efetivamente, do que se tratava naquele caso, ou seja, a manifestação do narcisismo na cultura... 

Penso que os colegas estavam certos, há mesmo que se ter coragem para olhar e falar sobre isso e estarmos atentos para não nos desviarmos do que o nosso desejo já anunciava lá atrás...


















O que lhe vem à mente?


Da proposta para que cada um pudesse dizer o que lhe vem à mente diante do tema "narcisismo das pequenas diferenças", seguimos compartilhando o que nos chegou:



Imagem feita por Cláudia, no centro da cidade.
Graffite de Rodrigo Rizo

“Desde os primórdios até hoje em dia, o homem ainda faz o que o macaco
fazia...” - Titãs

Dos primórdios à modernidade, o que te faz parecer igual ao outro?

Por Cláudia Regina B. Poffo

quarta-feira, 6 de junho de 2018

Maurício Maliska fala sobre o narcisismo das pequenas diferenças



Depois de um primeiro momento em que Maurício Maliska pontua questões importantes sobre o conceito de Narcisismo, temos uma fala sua com novas questões sobre o fenômeno "narcisismo das pequenas diferenças". 






Imagens que nos falam do tema


A partir do convite para que Maiêuticos enviassem imagens que vêm à mente ao pensar "O Narcisismo das Pequenas Diferenças", recebemos participações poéticas, provocativas, diversas... 


Seguiremos dividindo algumas! E para começar, a primeira que nos chegou:


"Na história da humanidade, o narcisismo das pequenas diferenças é marcado pela dominação, destruição e ódio de uns contra outros. Vemos estes fenômenos manifestarem-se na diferença entre os sexos, raças, classes sociais, religiosas, políticas etc.. A diversidade humana é a regra, não tolerar a tão desprezível equidade no outro semelhante pode levar a atos violentos e brutais.
Poder e dominação para garantir superioridade. É neste terreno que se forma o eu, na dualidade e na rivalidade. O combate que se arma com o rival, tão estranho e tão familiar denuncia a especularidade originária das relações. 
Todas as funções do eu são mobilizadas para garantir que seja amado e “reconhecido”. Reconhecido em sua grandeza única, majestosa. Sua pulsão de dominação e conhecimento intelectual são utilizados para tentar garantir sua supremacia e integridade. 
O diferente o ameaça, por isso agarra-se a um ideal imaginário para tentar anular sua fragilidade. O outro diferente precisa ser aniquilado, mantê-lo sob controle. Não há como reconhecê-lo tão parecido consigo mesmo."
Triunfo da Morte - último quadro do pintor judeu Felix Nussbaum*, terminado em 18 de abril de 1944. O trabalho é uma releitura, homônimo do quadro abaixo. 


Triunfo da morte - de Pieter Bruegel (O Velho), pintor flamengo renascentista do século XVI, obra de 1562.

*Felix Nussbaum, foi um pintor alemão de origem judaica, morto nos campos de concentração em agosto de 1944.
Ambos os pintores tiveram influência do holandês Hieronymus Bosch (1450-1516), citado por Lacan (O estádio do espelho, 1949, in: Escritos), quando nos esclarece sobre a função do eu para o sujeito. O eu para se constituir, precisa assumir uma imagem, unificar-se numa imagem ideal pela identificação com a imago do semelhante, uma espécie de "servidão imaginária". 
Amor e ódio são os dois lados do mesmo estado narcisista de investimento objetal, assim como podemos destacar a extrema agressividade subjacente no bom samaritano, no filantropo e no idealista. 

Por Tatiana Kuerten de Matos