quinta-feira, 17 de maio de 2018

Psicanálise, o que é isso?

Carlos Augusto Remor traz "o narcisismo das pequenas diferenças" ao pensar o que é a psicanálise e divide conosco seu entendimento sobre o tema a partir de Freud e Lacan. 


Psicanálise, o que é isso?
                        Carlos Augusto Remor[1]

            A invenção freudiana do inconsciente deu existência a Psicanálise. Seu nascimento representa uma quebra de todos os saberes da clínica médica, psiquiátrica e psicológica do século XIX.
            Além disso, representa também a mudança da visão medieval sobre as neuroses que surgiam sob a forma de epidemias e estavam na origem do que era considerado possessão e feitiçaria. Os histéricos tinham sido lançados à fogueira ou exorcizados e ainda hoje, não raro, estão sujeitos à maldição do ridículo.
            A transformação do método catártico[2]em psicanálise foi provocada pelo surgimento da teoria da repressão e da resistência, do reconhecimento da sexualidade e da interpretação de sonhos como fonte de conhecimento do inconsciente.
            O saber da psicanálise apareceu como o terceiro dos grandes golpes desferidos na reconfortante idéia que a humanidade tem de si mesma, forjada no amor-próprio, ou seja do seu narcisismo: com Copérnico, que a Terra não era o centro do Universo; com Darwin, de que não era mais a imagem e semelhança do Divino; e com Freud, que o homem não era mais dono e senhor dos seus próprios pensamentos.
            A psicanálise se atreveu ainda a questionar a sexualidade humana e chegou até à hipótese da sexualidade ser infantil. Questionou a opinião popular de que ela estaria ausente na infância e colocou em cheque o fato da existência da chamada doença mental.
            Vendo que as afirmações sobre a sexualidade não podem contar com o mesmo tratamento dado aos outros tipos de informações, o pai da psicanálise declara que passou a fazer parte do grupo dos que “perturbaram o sono do mundo”e que não poderia contar com objetividade e tolerânciapois seu golpe no narcisismo do humano fora grande demais.
            Em seu artigo “Psicopatologia da vida cotidiana”, Freud rompeu com a idéia de descontinuidade entre normalidade e psicopatologia, e instituiu a patologia como algo do homem comum. Tal idéia, já se encontrava no domínio público, expressa em ditos populares como: “de médico e de louco todo mundo tem um pouco”. A partir daí a consideração da sexualidade como normal e natural cai por terra. Temos, então, que há uma sensação de inadequação do sujeito com a sexualidade. Neste ponto, a troca das pulsões pelos mal traduzidos “instintos” tenta colocar a ideia da pretensa adequação sexual novamente em voga. Assim seríamos como os bichos, adequados ao sexo.
            Se Freud, pelas chamadas formações do inconsciente: sonhos, esquecimentos, atos-falhos, chistes e sintomas encontra o caminho para o inconsciente, através de sua objetivação pela linguagem, o psicanalista francês, Jacques Lacan o revive, enquanto os articula, por exemplo, na afirmação de que “o inconsciente é estruturado como uma linguagem” e, como não poderia deixar de ser, pelo Narcisismo das Pequenas Diferenças. Contudo, no meu entender, este é um modo quase do chiste que faz Lacan, pois o Narcisismo das Pequenas Diferenças nada mais é do que o ‘Narcisismo das Igualdades disfarçadas’. Ele o chama de pequenas diferenças porque em seu estilo quase irônico, deixa entrever o que Freud já advertira sobre o caráter narcísico do amor, de que se ama o semelhante! É um dito bíblico: amai o seu semelhante como a si próprio!
            Lacan é conhecido por sua releitura radical da obra freudiana, não só a partir da linguística, mas também, da filosofia, antropologia, matemática, lógica e, com um caráter especial para a psicanálise, da topologia.
            Hoje há uma psicanálise chamada de Freudo-Lacaniana, exatamente porque foi Lacan quem soube ler Freud e lhe deu vida novamente, restituiu, o sentido da obra de Freud. Esta leitura, que faz o mestre francês, é tão rigorosa que deu lugar ao nome de um importante movimento internacional: “Convergência, Movimento Lacaniano para a Psicanálise Freudiana”, do qual fazem parte mais de 40 instituições psicanalíticas de diversos países, entre elas a Maiêutica Florianópolis – Instituição Psicanalítica.

           
[1]Dr. Carlos Augusto M. Remor é psicanalista, um dos fundadores e ex-presidente da Maiêutica Florianópolis – Instituição Psicanalítica. Aposentado como Professor Associado e ex-Chefe do Departamento de Psicologia da UFSC; Mestre em Letras e Doutor em Engenharia de Produção pela UFSC.
[1]Método de tratamento das neuroses, usado pelo Dr. Joseph Breuer, com auxílio da hipnose.
            

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