quarta-feira, 1 de agosto de 2018

RASTREAMENTO DA FORMULAÇÃO FREUDIANA DA CRUELDADE

 


        

Em nossas jornadas teremos a oportunidade de escutar Betty B. Fuks e Ana Augusta B. Jaques, que nesse momento, compartilham conosco o trabalho que fizeram sobre o  RASTREAMENTO DA FORMULAÇÃO FREUDIANA DA CRUELDADE para demonstrar que "na teoria freudiana esta categoria não pode ser conduzida a qualquer leitura simplificada e moralista, sob pena de se perder sua importância na clínica e a dimensão que toma na crítica psicanalítica à cultura". 


Sob o impacto da Primeira Guerra Mundial, Freud, acometido por um forte sentimento de perplexidade e desilusão diante da desrazão que aflorava no coração da civilização europeia, indagava-se atônito: por que todas as conquistas intelectuais e científicas da cultura moderna não foram suficientes para diminuir a violência e a destruição entre os homens? Com um tom de profunda descrença no poder de liderança das nações mais avançadas técnica e cientificamente, e profundamente decepcionado com intelectuais e cientistas que, então, demonstravam uma clara afinidade para com o infernal, Freud transpõe para o papel, sob o título “Reflexões para os tempos de guerra e morte”(1915), suas primeiras elaborações sobre a violência e a categoria do mal na ordem dos fenômenos coletivos. Observa-se na leitura do texto que em nenhum momento Freud tenta explicar a guerra a partir da psicanálise, mas, ao revés, seu objetivo é tomar a violência e a crueldade como realidades do psiquismo, e disso retirar consequências teóricas. A fúria e obstinação com que então se expressava o desejo de destruição do outro forneciam a medida de que a guerra, a crueldade e a desumanização dos laços sociais não são apenas momentos efêmeros, fadados à superação no futuro. Muito ao contrário, são acontecimentos inexoráveis que incorporam um elemento radicalmente social e histórico.
Cético, Freud encaminha toda a discussão no sentido de demonstrar a impossibilidade de erradicar o Mal, mesmo porque os impulsos considerados negativos são de natureza primitiva. Por exemplo: não existe sujeito sem uma boa dose de agressividade; o que é diferente das manifestações que ocorrem no registro da agressividade não erotizada, tais como o assassinato e o extermínio. Em outras palavras, a cultura exige irremediavelmente muito trabalho para promover o convívio entre os homens, mas a confiança no progresso da inteligência e da razão está sujeita a retrocessos pela própria estrutura do sujeito e do movimento das civilizações. A guerra é a expressão privilegiada da destruição do outro que “leva nossos filhos a aprenderem na escola que a história do mundo é uma história de assassinatos dos povos.” (FREUD, 1915, p.331).
Na literatura psicanalítica, em geral, a abordagem da crueldade (Grausamkeit) esbarra no obscurantismo que a qualifica. Em sua maioria, os autores fazem uso desta categoria a partir da segunda tópica e da leitura freudiana dos fenômenos da cultura. Entretanto, a palavra crueldade já se encontra presente na obra inaugural da psicanálise, A Interpretação dos Sonhos (1900), sobretudo na parte em que Freud desenvolve ideias sobre o mecanismo de condensação. Com vistas a demonstrar que este mecanismo psíquico cria compromissos e meios-termos entre diversas séries de representações e pensamentos, o autor analisa o sonho de uma paciente cujo tema gira em torno da crueldade praticada por crianças com animais. Eis o conteúdo do sonho que denominou de Sonho do besouro-de-maio. “[A paciente] se lembrou de que tinha dois besouros-de-maio numa caixa e precisava libertá-los, caso contrário, ficariam sufocados. Abriu a caixa e os besouros estavam em estado de esgotamento. Um deles voou pela janela aberta, mas o outro foi esmagado pelo caixilho da janela enquanto ela a fechava a pedido de alguém”, escreve Freud (Ibid, p.281).
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Um comentário:

  1. Nesse texto localizamos o primeiro uso por Freud da expressão “pulsão de crueldade”. O texto é um primor! Convido todos a sua leitura!

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